SOBRE O ESPETÁCULO:
Um rio virou mar é um espetáculo que toma
como ponto central questionamentos acerca dos medos, acessando o imaginário
lúdico e criativo da criança como suporte para a construção da poética
dramatúrgica e a construção cenográfica.
A dramaturgia desenvolve-se a partir do
brincar, da construção das infinitas possibilidades que é contar histórias.
O texto desenvolve-se a partir de um rio, construído de pedaços de
tecidos em tonalidades de azul. Há uma proposta de teatro de animação. No
entanto, os atores brincam: vão se transformando ora em manipuladores dos objetos,
ora em personagens, numa metamorfose poética, provocando a criança ao
problematizar os medos do rio, e que também são os medos comuns à própria
criança.
Nesse contexto, os atores expõem-se
totalmente às crianças. Brincam com elas enquanto estão encenando e contando a
história do rio que tem medo de crescer. Há de se perguntar:
- O que vai ser quando você crescer?
Para o pequeno rio, antes de crescer e de se
transforma em mar, há muita história que precisa ser contada.
CONCEPÇÃO:
É comum ouvirmos falar dramático como
sinônimo de teatral. Originalmente, drama está ligado a movimento, um texto
posto em ação, em movimento. No entanto, o movimento que aqui propomos não se
restringe apenas ao movimento concernente à entrada e saída de atores, montagem
e desmontagem de elementos cenográficos que por vezes provoca correrias. Propomos
algo para além disso.
O espetáculo “Um rio virou mar” propõem
movimento além dos grandes aparatos utilizados em grande parte dos espetáculos
para infância, a mudança aqui, estrutura-se no jogo cênico entre os dois atores
que estão em cena, os quais vão utilizando tecidos, objetos sonoros e transformando-se
em personagens.
As obras surrealistas possibilitam
diversas interpretações, já que são carregadas de símbolos e com pouca ou
nenhuma representação da realidade. Salvador Dalí fundamentou sua obra dentro
do surrealismo, movimento influenciado pelas teorias psicanalíticas de Freud, e
que buscou o afastamento da lógica e da razão no fazer artístico. É um
movimento cheio de elementos que fogem do plano racional e expõe objetos do
cotidiano numa perspectiva não convencional.
Para a construção cenográfica do
espetáculo “Um virou mar”, partiremos das obras do Paul Klee em sua fase
surrealista. Buscar-se-á em suas pinturas elementos para a composição visual do
espetáculo, trazendo traços, cores e elementos que fujam da concepção
tradicional.
O cenário composto por elementos simples,
será redefinido o tempo inteiro pelos dois atores que estão em cena, buscando
dialogar com as crianças como se estivessem numa brincadeira, contando e
cantando a história do rio
Em suas propostas acerca da cenografia,
Appia “abominava elementos decorativos inúteis. Usava praticáveis, organizando
e compondo o espaço horizontal – o chão – e ao mesmo tempo estabelecendo planos
na vertical, através do uso de cortinas. (...) A beleza do seu trabalho está na
simplicidade dos elementos, plástica pensada em função da encenação”
(MANTOVANI, 1989).
Nesse sentido, as representações
utilizadas em algumas obras de Paul Klee, irão delinear esteticamente o
espetáculo, buscando simplicidade e estabelecendo um ritmo cenográfico que
dialogue com luz e a música ao vivo. Tal perspectiva dialoga com o pensamento
de Appia, que “acreditava que a mudança de luz poderia criar um drama interior
que fluísse e mudasse com a textura musical; a intensidade, cor e direção da
luz poderiam refletir a mudança de atmosfera do trabalho” (WILD, 2006),
constituindo, por si só, o espaço cênico, numa espécie de iluminação
cenográfica.
No espaço cênico de “Um rio virou mar”, varal
com tecidos coloridos, colchas de retalho, cortinas em mosaicos, bacias,
praticáveis e objetos inspirados em obras do Paul Klee, irão tomar outras
formas a partir da manipulação dos atores.
Os atores trajarão um figurino neutro, podendo
assumir várias personagens. Na maquiagem, uma leve máscara branca, e com olhos
e bocas acentuados para “teatralizar” e reforçar as expressões e neutralizar o
lugar comum dos seus rostos.
sonoplastia
A sonoplastia do espetáculo é executada ao vivo pelos dois
atores. Eles revezar-se-ão em instrumentos como violão, flauta, xilofone,
escaleta, percussão e instrumentos alternativos.
As músicas são adaptações (versões) do folclore e que pontuam
as cenas, conforme os “Songs Brechtianos” (relativo
a Brecht).
A esse respeito, Benjamin
(1987) percebe que as questões que mobilizaram Brecht no estabelecimento dessas
propostas foram norteadas pela intenção de permitir a apropriação da vivência
artística como experiência social. Um tipo de apropriação por partes, que
permite uma contextualização do fenômeno a partir de diversos ângulos,
possibilitando assim que a vivência se torne de fato uma experiência
consciente. A música, nesse sentido, é um veículo que estabelece outro (s)
ângulo (s), conforme aponta Koudela (1981):
Destrinchar o fenômeno cênico implica em
seguir vários ângulos e estabelecer uma compreensão tática que prepara para um
posicionamento social. A autora condiciona a música e seu uso. Aponta que ela
precisa ser artística e ao mesmo tempo acessível aos participantes-figurantes
(plateia). E o espaço de seu uso não pode mais ser um espaço especificamente
marcado, como o fosso cênico.
Assim,
o espetáculo constrói-se como um pequeno musical, utilizando as músicas do
folclore brasileiro, adaptadas, como possibilidade de uma construção lúdica,
mágica e poética.
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